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terça-feira, 10 de maio de 2011

CAPÍTULO III

Crédito da foto: br.viarural.com



CAPÍTULO III

Julho de 1976. Largo da prainha bem cedinho, mal começa clarear o dia. Vou descendo o rio atento, tudo observando, respirando a Natureza pródiga do Rio Araguaia. O ar é puro, cheira a mata. Nada de poluição, de gás carbônico. Parece que meus pulmões se enchem mais, a respiração fácil, as idéias claras. Sinto-me bem, meu organismo funciona como um relógio.

O barco segue a correnteza, margeando de um lado ou outro o rio, às vezes o atravessando, procurando sempre as curvas fechadas, onde a água passa com mais força. Quando encosta em algum galho de árvore, ficando preso em um remanso, é necessário empurrá-lo para fora, com as mãos ou com a vara. Às vezes fica rodando em volta de sim mesmo, quando entra em um redemoinho , sendo então preciso usar com força o comprido remo de alumínio, remando da proa, puxando o barco. Não se pode descuidar, viajando assim ao sabor dos caprichos do rio. Surgem troncos de árvores tombadas, geralmente pequenos, às vezes grandes, o barco descendo rápido em sua direção. Sento na proa, na popa ou na varanda, na posição onde o tronco deve bater. Quando ele já está ao alcance, ergo os pés e os ponho de encontro ao tronco, sustentando firme, empurrando com força quando o barco se detém por alguns instantes, desviando-o Ele roda e continua a descer. É um trabalho contínuo, às vezes sendo necessário um grande esforço físico, mas tudo é agradável.

De manhãzinha o barco está passando bem perto do barranco coberto de capim. Ouço ruídos na mata rala que existe logo adiante. E logo surge dela uma grande onça preta correndo, um camaleão grande na boca, debatendo-se desesperadamente.

Vou passando por uma parte baixa, cheia de capim alto. Avistando o barco, um grande jacaré se atira na água, fazendo um barulhão. Bem ali perto, vejo um bando de veados, as fêmeas na margem, comendo capim, um macho mais para dentro, cabeça em pé mostrando a galhada de animal já de certa idade. Espreita as fêmeas, vigia-as. Será que algum deles viu o jacaré?

Costeando a Ilha do Bananal, às vezes encosto em um barranco, quando o barco passa perto dele e eu consigo segurar em alguma árvore. Fiz uma garateia de barrote de ferro e, às vezes, a jogo em um galho, amarrando o barco. Vou a terra, subindo o barranco, às vezes muito alto. Tenho de subir me agarrando em cipós, em raízes de grandes árvores, descobertas pelas águas. Caminho pela mata a esmo, procurando sem saber o quê. A mata é mais ou menos densa, mas debaixo das árvores o terreno é limpo, fácil e agradável de caminhar. Encontro um pequeno lago, sento-me em um tronco caído e fico observando tudo em volta.

Um filhote de quati vem se aproximando timidamente, olhando-me enquanto caminha vagarosamente. Vem até ficar uns dois metros de mim, rabinho empinado. Fica brincando por ali, cheirando a terra aqui e acolá, talvez à procura de um formigueiro. Estou imóvel, sei que se mexer-me ele correrá. Depois de alguns minutos, levanto-me e ele nem se move, olhando-me. Vou-me aproximando dele devagarinho e ele continua parado. Só corre para a mata quando eu me abaixo para afagá-lo.

Bem perto vejo um pequeno lago, ouço o ruído de águas batendo. Vou me aproximando devagar, pensando que iria encontrar um jacaré na margem de lama. O lago não tem mais de cinco metros de largura, embora seja comprido. Um grande pirarucu ficou preso nele. E nada, de uma lado para outro, procurando uma saída. Talvez ele sobreviva, se nenhum pescador tiver a idéia de encostar ali. Fico apreciando as evoluções do grande peixe, com mais de dois metros. Aparecem tucunarés, alguns bem grandes, nadando velozmente atrás de pequenos peixes, que fogem em nado rápido.

Fiz várias estadas no rio, em várias épocas do ano. Caminhando por terra, encontrava sempre alguns pequenos lagos. Pescava neles e fui observando certas peculiaridades. Logo que ficam separados do rio, que se une a eles quando enche, ficam cheios de peixes, principalmente pacus, piranhas e traíras. Sempre pensei que as piranhas fosse os peixes mais valentes e vorazes do rio, mas não é essa a verdade. O lago vai secando, as traíras e piranhas, sem dele poderem sair, vão devorando os outros peixes que também ficam presos. Por fim, restam no lago apenas elas. E eu pensei que as piranhas, nessas circunstâncias, acabariam com as traíras. Ledo engano, como diria o literato. Encontrei muitos lagos, já tão secos que quase não tinham água. E jogando meu anzol neles, pesquei traíras, grandes e gordas.
Continua.....

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